Governo Federal República Federativa do Brasil Ministério da Educação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Universidade Federal de Goiás

EM DEFESA DO DIREITO À EDUCAÇÃO ESCOLAR:

DIDÁTICA, CURRÍCULO E POLÍTICAS EDUCACIONAIS EM DEBATE

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SEÇÃO 1
AUTOR Romualdo Pessoa Campos Filho
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Educação Brasileira: da Pátria Educadora à Ponte para o Futuro Sombrio Rumo ao Abismo

Quando a presidenta Dilma Rousseff, em 2015, apresentou o slogan ‘Pátria Educadora” para seu segundo mandato, a escolha desse tema como prioridade para as ações do Estado brasileiro nos anos que se seguiriam gerou em setores da sociedade uma expectativa bastante positiva. Ocorre que os anos que se seguiram representaram um dos piores retrocessos políticos de nossa história recente. A rapidez com que se desconstruíram conquistas importantes ainda que incompletas, sintetizou a volúpia e perversidade dos segmentos mais conservadores e reacionários da política brasileira expressamente vinculados aos interesses que culminaram na deposição de uma presidenta legitimamente eleita. Esse ato político configurou-se, inegavelmente, como golpe jurídico-parlamentar, seguindo-se às estratégias adotadas em outros países da América Latina, de recompor a afinidade política com os desejos imperialistas dos Estados Unidos, bem como garantir às grandes corporações multinacionais maior liberdade de ações rapaces sobre as nossas riquezas. As questões sociais assumiram o primeiro plano dessas estratégias passando a sofrer ataque sistemático desses setores. Afinal, era essencial atingir o governo em seu ponto forte. É esse o tema a ser analisado neste capítulo tendo como principal referência a educação.

Para uma análise de conjunto dessa problemática, não é suficiente fazermos um recorte temporal tendo somente como foco os anos 2000, essas duas primeiras décadas do século XXI. Os atos políticos que têm levado o nosso país a uma crise descomunal nos dias atuais representam uma síntese de uma longa história, possíveis de serem compreendidos somente se buscarmos por todo o século XX as artimanhas arquitetadas e construídas por uma elite perversa e anti-nação.

Ao longo de nossa história republicana – um curto tempo de oscilações conjunturais radicais – praticamente as tentativas de diversos governos de resolver problemas assentados em fortes desigualdades sociais, foram sistematicamente atacados por uma elite política e econômica voraz e desprovida de qualquer senso de justiça e da verdadeira democracia. Em quase todas essas situações, e tendo contra si o brado reacionário de uma imprensa servil àqueles interesses, os governantes que ousaram enfrentar as classes dominantes e abrir caminho para políticas compensatórias e de atendimento às demandas das populações mais pobres, foram sistematicamente atacados e desqualificados com a alcunha de “populistas”. Assim eram chamados os presidentes que, tanto no Brasil como de resto em toda a América Latina, apresentavam propostas e projetos visando garantir políticas que atendessem às demandas sociais. Essa alcunha não é necessariamente uma ofensa para quem tem olhos voltados para as necessárias medidas que redundem em soluções dos nossos graves problemas. Assim se deu com Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck, João Goulart e Luís Inácio Lula da Silva. Sem rodeios, embora a história dê consistência às nossas análises, o século XXI representa um novo patamar dessas encruzilhadas políticas, quando o país se vê entre o desenvolvimento nacional, com absorções de políticas sociais; ou pelo caminho da dependência e do servilismo aos interesses internacionais e a manutenção dos privilégios de uma casta que há séculos acumula riquezas à custa da pobreza da maioria da população.

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O caminho brasileiro parecia traçado nessa primeira direção. Toda a primeira década do século XX representou uma esperança de mudança nos rumos do desenvolvimento brasileiro, ainda que o final do século tivesse sido desastroso, com o país vivendo o auge das políticas neoliberais, em toda a sua essência. A eleição de Lula da Silva trouxe alento e expectativas, ainda que algumas delas tenham sido inicialmente frustradas nas diretrizes econômicas por representarem resquícios do neoliberalismo. No entanto, ao longo da década e em meio a uma das maiores crises do capitalismo, o Brasil surfou em águas calmas e bravias e se destacou internacionalmente assumindo o papel de protagonista na geopolítica mundial. Passou praticamente incólume por essa crise, que ainda persiste em gerar instabilidades na maioria dos países, e seguirá assim por algum tempo.

Dessa forma, o governo Lula, mesmo não implantando uma política de contenção da concentração exagerada de riqueza nas mãos de uma pequena parcela da sociedade, procurou implementar projetos, programas e ações que reduzissem as desigualdades sociais, abrindo um leque de opções para as camadas mais pobres da sociedade desde a garantia de terem o mínimo para sobreviverem, até a possibilidade de acesso de seus filhos aos cursos superiores públicos ou por meio de bolsas e financiamento em instituições privadas de ensino. Ao mesmo tempo, foi impulsionado o investimento estatal em obras de médio e grande porte incrementando a construção civil e a produção industrial, fazendo com que se elevassem as ofertas de empregos. Além disso, o aumento do salário-mínimo, ano a ano, acima da inflação, garantiu ganhos reais, possibilitando melhorias nas condições de vida de milhões de famílias brasileiras.

Chocando o ovo da serpente: a preparação para um golpe

Dois dos programas mais controversos, embora não fossem criações nossas, tinham relação direta entre a inclusão social e a educação, o Bolsa Família e o sistema de cotas. O Bolsa Família, que tornou obrigatória a frequência regular das crianças nas escolas para que o benefício pudesse ser repassado às famílias; o sistema de cotas para ingresso no ensino superior para grupos étnicos socialmente penalizados historicamente ou de origens sociais pobres. Igualmente, duas outras medidas apontavam para o fortalecimento da educação brasileira: o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação das Universidades Federais (REUNI), o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) e o Plano Nacional de Educação (PNE). Embora controverso, podemos também incluir nessa lista o Programa Universidade Para Todos (PROUNI), por meio do qual estudantes de rendas mais baixas poderiam obter bolsas de estudos integrais ou parciais (50%) em instituições superiores privadas de ensino.

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No entanto, todo o ímpeto com que se deram os avanços resultantes dessas medidas e da priorização no setor da educação, pesquisa e desenvolvimento tecnológico, sofreria um revés que lançaria por terra todas essas conquistas da sociedade e que jogaria o país de volta às trevas do mais terrível período neoliberal em nosso país, no final da década de 1990 e começo do século XXI. A “Pátria Educadora” foi atingida covardemente por uma burguesia que carrega em seu DNA características natas do golpismo, da afronta à democracia e aos desejos do povo, e a perversidade das elites coloniais na relação com a Nação, sua riqueza e com sua populaçãoSobre essa característica da burguesia e da “elite” brasileira, sugiro as leituras dos livros de Jessé de Souza: “A Tolice da inteligência brasileira – ou como o país se deixa manipular pela elite” (2015) e “A Elite do Atraso – da escravidão à Lavajato” (2017), ambos publicados pela editora Leya Brasil.. Com efeito, as eleições de 2014 se deram em um ambiente político bastante hostil. As perspectivas, caso se consolidasse a vitória e reeleição de Dilma Rousseff, seria da volta à presidência na eleição seguinte do ex-presidente Lula, ampliando o ciclo de vigência da esquerda no Poder e, consequentemente, a ampliação de programas sociais cujo foco seria a educação e a inclusão social. Para uma burguesia acostumada em ter para si a riqueza e o poder político, isso se tornou inadmissível. A reação, então, ocorreu logo após estar definido o resultado eleitoral. Confirmado esse quadro, o temor do retorno de Lula foi a senha para se iniciar o processo de desestabilização do governo da presidenta. Tal como se repetia por diversos outros países da América Latina, a grande mídia agiu de forma agressiva por meio de notícias retumbantes que desqualificavam a presidenta, acusando-a de ser a responsável pela quebra do país e de adotar políticas públicas que geravam uma forte crise fiscal. Pouco a pouco, tudo que se conquistara no país em benefício das populações mais pobres foi sendo apontado como a causa que levara o Estado brasileiro à crise. Tamanha foi a onda midiática, as “fake news” e as disseminações de notas pejorativas contra a presidenta, que o desgaste de sua imagem a tornou impopular até mesmo para os mais pobres, que seriam as principais vítimas de todo o revés que o país passou a viver.

Todo esse processo não nos foi informado por constar nos livros de história. Somos a geração que fez parte de uma conjuntura política em que foi implementado um golpe de estado que envolveu a mídia, o parlamento e o judiciário. Vivemos isso. A história registrará mais adiante, em detalhes, cada momento do que aconteceu e o que estava por trás disso tudo. Por que razão foram desconstruídas políticas que alavancavam o país e o colocava em destaque na geopolítica mundial? Em todos os indicadores, desde a economia, passando pela educação, ciência e tecnologia, emprego, avanços sociais, redução da pobreza, indústria, agronegócio, o salto à frente do Brasil, comparando-se com o século passado e também com outras Nações do Mundo, foi impressionante. Porque, então, se criou uma situação política de desestabilização do país, impediram-se medidas para resolver problemas fiscais, ampliou-se o desemprego, gerou uma forte recessão, e reduziram-se drasticamente os investimentos em saúde, educação, programas sociais e desenvolvimento científico e tecnológico?

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É elementar saber, pelo que a própria realidade nos mostra e se apresenta em países com alto índice de desenvolvimento, que a educação é a base fundamental para solucionar problemas crônicos de atrasos econômicos e desigualdades sociais. Se estávamos indo numa direção de inserção entre as maiores nações e criando condições para ampliarmos nosso potencial de desenvolvimento, o golpe instituído em 2015 puxou o freio de mão e engatou uma marcha ré, gerando um efeito desequilibrador e destruidor de tudo que se vinha construindo. Mas se houve perversidade nesse processo, é vital reconhecer que nada disso se deu por acaso, foi intencional e previamente planejado. Vamos então analisar as mudanças que passaram a acontecer a partir de então, e a rapidez com que foram destruídas diversas medidas tomadas nos governos Lula e Dilma que transformavam a educação brasileira. O Brasil ficou, absolutamente, fora de rumo.

Chocando o ovo da serpente: a preparação para um golpe

O golpe logrou levar ao poder figuras que compunham o universo dos partidos perdedores do pleito presidencial, quando a presidenta Dilma foi reeleita. Foram indicados para ministérios importantes, incluindo o da Educação, políticos ligados ao partido mais ideologicamente identificado com uma direita orgânica, antinacional, privatista e neoliberal: o Democratas (DEM). O nome indicado para a Educação, o deputado Mendonça Filho, era um dos mais ferrenhos opositores do governo legítimo. Já era possível prever que o objetivo seria desconstruir todas as políticas e programas adotados pelo MEC e que representavam avanços significativos na área, embora muito ainda precisasse ser feito. Os protagonistas dessa guinada na política brasileira sabiam da importância estratégica do Ministério da Educação, e tinham clareza que precisavam desconstruir projetos, programas e políticas nessa área que levariam o país em outra direção.

É preciso compreender que o golpe veio justamente para modificar toda a linha programática do governo e direcioná-lo para um caminho que interessava às elites perversas desse país, que não se contentam somente com o acúmulo crescente de suas riquezas, mas desejam impedir que as camadas pobres ascendam a condições melhores de vida. Essa perversão se traduz na forma como todo esse processo de formação socioeconômica se deu aqui no Brasil, conforme expôs bem Darcy Ribeiro, em sua obra clássica “O Povo Brasileiro”.

Não há, nunca houve, aqui um povo livre, regendo seu destino na busca de sua própria prosperidade. O que houve e o que há é uma massa de trabalhadores explorada, humilhada e ofendida por uma minoria dominante, espantosamente eficaz na formulação e manutenção de seu próprio projeto de prosperidade, sempre pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma da ordem social vigente”. (RIBEIRO, 1995, p. 446).RIBEIRO. Darcy, O Povo Brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

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As áreas da Educação e da Saúde sempre foram vistas como focos de atuação organizada dos movimentos de esquerda. Mas deve-se considerar não somente a tradição de haver de fato uma forte atuação dos movimentos organizados nessas áreas, mas as vermos como importantes também do ponto de vista estratégico bem como por serem fundamentais para o atendimento de demandas advindas dos segmentos mais fragilizados da sociedade. O que significa dizer que carregam sentimentos ideológicos de garantia de uma educação e de uma saúde públicas que atendam as reivindicações da maioria da população. Ocorre que os setores conservadores, neoliberais, também veem essas áreas dessa maneira, mas com um viés oposto, e são nítidas suas intenções privatistas sobre essas duas áreas. Portanto, a indicação de um ministro do partido Democratas para o Ministério da Educação não foi por acaso, teve como objetivo desconstruir tudo o que vinha sendo feito em termos de fortalecimento de inclusão social e de inserção do país no campo da ciência. Os cortes nos investimentos feitos pelo governo Temer na educação e na produção científica nos anos que se seguiram comprovam isso.

Os acontecimentos anteriores ao golpe a partir de 2013, e o que aconteceu nos anos seguintes à deposição da presidenta Dilma Rousseff não foi fruto do acaso ou motivados por supostos “crimes” de responsabilidade cometidos por ela. Houve motivação, preparação e ações desestabilizadoras. Esse ano de 2013 foi fatídico, mas não somente por causa das chamadas “jornadas de junho” e as manifestações que sacudiram o país por diversos meses e que foram instrumentalizadas pelos setores políticos conservadores, de direita, pela mídia e por agentes estrangeiros que atuaram por meio de ONGs para atingir o governo. É preciso analisar outros elementos para além da manipulação dos meios de comunicação, procurando entender as transformações pelas quais o país passava desde o governo Lula. É assim que encontraremos respostas para o que aconteceu nos anos seguintes. As batalhas que o país viu nas ruas e davam a impressão de vivermos no pior dos momentos de nossa história, fizeram parte de algo arquitetado para destruir conquistas sociais, mas, fundamentalmente, para impedir que o Brasil tivesse autonomia na exploração de uma imensa riqueza descoberta, para que isso não ficasse quase exclusivamente nas mãos da Petrobrás. A destinação dos recursos do Pré-sal importava, e muito, a setores entreguistas, e por essa razão, dentre muitas, buscaram solapar e desestabilizar o governo, aproveitando-se da insatisfação da juventude por questões específicas que diziam respeito à mobilidade nas grandes cidades e ao custo do transporte para os estudantes, além de outras demandas incorporadas nas manifestações que explodiram por todo o país.

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Por detrás de tudo aquilo que se expunha no meio político e nas mídias injustamente contra a presidenta Dilma Roussef, estava um desejo rapace de derrotá-la em suas propostas de aplicação do Pré-sal e da obrigatoriedade de a Petrobrás estar presente na exploração do petróleo, principalmente naqueles poços com maior potencial. E quando olhamos para a data da promulgação da lei que destinava os percentuais dos royalties para a educação e a saúde - 9 de setembro de 2013Disponível em: http://www.brasil.gov.br/governo/2013/09/sancionada-lei-que-destina-royalties-do-petroleo-para-saude-e-educacao. Acesso em: 14 ago. 2018. - é possível compreender porque dali em diante se intensificaram os ataques e as ações para desmoralizar o governo. Não houve trégua a partir daí. O objetivo era derrotar o governo nas eleições de 2014, e as ações desestabilizadoras prosseguiram por todo aquele ano com o foco passando a ser direcionado para a Copa do Mundo que se realizaria aqui no Brasil. O intuito dessas ações foi ofuscar o brilho desse grande evento e sua visibilidade internacional. Desse modo, as manifestações se tornaram cada vez mais violentas, com atos de depredações e descontroles que passavam a imagem de um país em convulsão. O que se viu no Brasil nos anos de 2013 e 2014 se assemelharam às mesmas situações porque passaram diversos países tanto na “revolução colorida” que envolveu países da antiga União Soviética como a chamada “primavera árabe”, nos países do Oriente Médio. E em todas essas situações as agitações não foram somente levadas adiante por grupos internos, mas contou com a ação de ONGs financiadas por corporações estrangeiras e agentes infiltrados, com o claro objetivo de desestabilizar os governos e possibilitar a mudança de linha política.

As consequências dessas ações não aconteceram de imediato. As eleições de 2014, embora muito acirradas e com uma diferença pequena entre as candidaturas de Dilma Rousseff e o candidato de oposição Aécio Neves, garantiram a reeleição da presidenta, mas levantaram o temor entre os setores conservadores, de que inevitavelmente as próximas eleições trariam o ex-presidente Lula de volta. Esse pânico que se instalaria entre esses segmentos da oposição, e a constatação pelo resultado eleitoral que as ações desestabilizadoras não haviam surtido efeito, levou a execução de outro plano, que passaria a se efetivar a partir da identificação de uma profunda crise fiscal no governo, e não posta de forma clara durante a campanha eleitoral. Mas, independentemente disso, alguma razão seria encontrada, haja vista a própria declaração do candidato derrotado na convenção de seu partido ao ser conduzido à presidência do mesmo, antes de virem à tona as denúncias que o incluíam no rol de denunciados e réus da Operação Lava-JatoDisponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/em-convencao-aecio-diz-que-dilma-nao-concluira-mandato-faz-apelo-por-unidade-no-psdb-16667961. Acesso em: 15 ago. 2018.. Percebia-se pelas movimentações nos bastidores, pela ação da mídia e os embates no Congresso Nacional, que seria difícil o governo se sustentar. A presidenta já se tornara alvo, e tudo passou a ser feito para solapar suas iniciativas para superar a crise, impedindo-a de encontrar saída para o problema fiscal, dificultando a governança e abrindo caminho para a sua deposição, levando a cabo o que se pretendeu fazer desde o segundo semestre de 2013.

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Os anos seguintes, no entanto, seriam piores, já que o desgaste do governo se somava às ações de uma operação anticorrupção que visava chegar ao núcleo dirigente do Partido dos Trabalhadores, contribuir com o desgaste da presidenta até o seu impeachment e impedir o ex-presidente Lula de voltar a ser uma opção de saída para as dificuldades que o país atravessava. Consumou-se dessa maneira o golpe institucional e, a partir daí, as medidas tomadas pelo governo de Michel Temer ao assumir a presidência iriam todas elas na contramão de tudo que se construíra em mais de uma década de avanços em setores fundamentais, dentre eles a educação, a saúde e a luta pelos direitos humanos.

O golpe cumpria seu objetivo implementando políticas completamente opostas àquelas que garantiram a reeleição da presidenta Dilma, legitimamente eleita pelo povo. Nada do que viria a ser aplicado passara pelo crivo da população, e as medidas perversamente praticadas tornavam institucional a crise econômica na medida em que se retirava do Estado as condições para investir em atividades essenciais para garantia de emprego, qualificação e proteção à saúde. No caso da Petrobrás, uma das maiores empresas estatais, retirou-se dela a condução do processo de exploração do Pré-Sal, transferindo lucros do petróleo para grandes corporações estrangeiras e impedindo investimentos em educação e saúde.

Verifica-se, assim, que a educação se tornou um dos alvos principais para desconstruir todos os avanços obtidos até então, e fazer com que as projeções que se faziam para as melhorias fossem sufocadas e extintas, substituídas por projetos que foram na contramão de tudo que se propôs na eleição, configurando uma traição por parte daqueles que assacaram o poder. A educação não se constituiu em um alvo meramente por uma questão de “conter o controle ideológico” que supostamente a esquerda teria nessa área. Esse aspecto aparecia nas iniciativas que destruíram projetos, mas os interesses privatistas se constituíram, também, em objetivos claros nas iniciativas tomadas. A redução dos recursos a serem investidos pelo Estado nos anos seguintes bem como os cortes estabelecidos desde 2015, criaram dificuldades para a educação pública, principalmente a superior, em universidades e instituto tecnológicos, suportar a demanda existente pelo crescimento do número de vagas em graduação e pós-graduação, pela expansão dos espaços físicos desde o REUNI (Programa de Reestruturação das Universidades Brasileiras) e pelo aumento do número de novas Instituições de Ensino Superior (IES)Disponível em: http://www.adufrgs.org.br/wp-content/uploads/2018/05/Conferencia_Livre_Adufrgs_Gil-Vicente-Reis-de-Figueiredo_As-consequ%C3%AAncias-da-EC-95.pdf. Acesso em: 15 ago. 2018..

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Figura 1. Expansão da educação superior pública no Brasil, a partir do ano de 2003.
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Neste gráfico fica patente o forte crescimento na educação superior. O governo Temer, em que pese essa realidade, propôs e aprovou o congelamento dos investimentos por 20 anos. Mas, para além dos cortes dos recursos, conforme tabelas apresentadas em sequência em relação às pesquisas e os cursos de pós-graduação, também o Ensino Médio e Ensino Fundamental sofreram consequências das medidas de desconstrução de iniciativas levadas a efeito nos últimos anos, inclusive com a intensa participação dos setores ligados à educação, dentre elas a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), a Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE). Essas entidades, juntamente com outras tantas instituições travam, então, uma forte batalha contra a aplicação de políticas arquitetadas no Ministério da Educação e que jogam por terra o esforço feito para transformar a educação brasileira e consolidar projetos visando a melhoria de sua posição em rankings cujos indicadores foram por muito tempo desfavoráveisDisponível em: http://www4.fe.usp.br/manifestos-das-entidades-nacionais-de-educacao-sobre-a-bncc-ensino-medio-e-o-programa-capes-residencia-pedagogica. Acesso em: 16 ago. 2018.. Principalmente, em tratar de forma inclusiva a educação, como condição para corrigir distorções históricas por muito tempo negando às camadas mais pobres e de regiões mais afastadas dos grandes centros econômicos, a possibilidade de acesso ao mercado de trabalho com melhores condições de competição com quem é oriundo das camadas média e alta da sociedade.

Ao agir para desconstruir as políticas postas em prática desde a virada do século, os ocupantes do Ministério da Educação indicados por Michel Temer não apenas retiraram recursos fundamentais para garantia de um ensino público e de qualidade como, também, alteraram princípios fundamentais do processo formativo que pudesse oferecer um ensino laico, democrático, multidisciplinar, humanista e inclusivo. Demonstrava-se, claramente, com isso, o intento de redirecionar por completo o conteúdo e as práticas a serem desenvolvidas nas escolas e sufocar, principalmente, as instituições federais de ensino como estratégia para proceder ao processo de privatização e de cobranças de mensalidades, sob o argumento das dificuldades financeiras.

Havia, certamente, outros alvos de ataque, conforme mencionado anteriormente. Mas a educação foi especialmente atingida devido ao fato de ela conduzir ideologicamente os rumos de um país, desde a formação de seus jovens até a garantia de qualificação por atacado, condição para se destacar no bloco das nações mais avançadas em ciência, tecnologia e inovação. Em nosso caso, a educação é, obviamente, uma condição necessária para reforçar internamente áreas formativas por muito tempo deficientes e dependentes de profissionais qualificados do exterior.

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Conforme a tradição conservadora herdada do período colonial, a subserviência e a dependência em relação a países europeus e dos EUA, os dirigentes que passaram a comandar o país, velhos em suas manhas e perversidades contra nossa soberania e as riquezas naturais, criaram rapidamente os mecanismos para destruir as políticas que estavam garantindo ao Brasil a condição de se tornar uma Nação forte, soberana a ser inserida entre as cinco maiores economias do mundo. Desse modo, na contramão de tudo o que se fez anteriormente, a maioria dos partidos conservadores e de seus parlamentares, aprovou uma Emenda Constitucional, que ao final levou o número 95 (EC-95), pela qual se impedia pelos próximos 20 anos qualquer aumento do orçamento nos montantes destinados até 2016 para setores cruciais entre os quais saúde, educação, direitos humanos, ciência e tecnologia, limitando-se somente à reposição do índice inflacionário e, dessa forma, desconsiderando toda a necessidade de sustentar um crescimento decorrente de todos os investimentos que se fez, além de não levar em conta o crescimento natural da população por todo esse períodoIdem, nota 5. (Figura 2).

Figura 2. Comparativo de investimento financeiro na educação pelo PNE 2014-2024 e com a EC-95.

Essa emenda, aprovada para estabelecer um limite no teto de gastos do governo federal, atingiu duramente os ministérios que mais trabalhavam com projetos sociais e representou o suprassumo das políticas neoliberais que visam medidas de austeridade e impede avanços em setores essenciais para garantir as melhorias na qualidade de vida da população. Afetou fortemente a educação e a saúde, sempre as áreas que mais recebem recursos orçamentários e que eram por lei protegidos naqueles percentuais obrigatórios, sendo essa uma das maiores conquistas dos últimos anos que cai por terra com a “PEC da maldade”Disponível em: https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/senado-promulga-emenda-constitucional-que-congela-gastos-da-uniao-nos-proximos-anos/. Acesso em: 16 ago. 2018., como ficou conhecida essa proposta de emenda constitucional desde o seu nascedouro poucos meses depois da destituição da presidenta Dilma Rousseff. A celeridade com que se deu sua tramitação na Câmara e Senado Federal dá a indicação que já havia uma estratégia preparada para atacar aquelas conquistas dos segmentos organizados da sociedade e que se tornaram referências em órgãos internacionais, alguns dos quais estavam a servir de modelos para outros países e referendados até mesmo por organismos da Organização das Nações Unidas (ONU).

O que assistimos a partir de 2015 foi a montagem de todo um arsenal de medidas que tiveram suporte no Congresso Nacional, majoritariamente conservador e comprometido com o governo golpista, empenhado em desfazer uma legislação progressista bem como reduzir os investimentos que foram fundamentais para fazer o país dar um salto significativo, que elevou os índices de avaliação em setores estratégicos (Figura 3). O congelamento dos investimentos representa um atraso que impressiona pelas consequências que já estão sendo sentidas no âmbito da educação e da saúde.

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Figura 3. Metas previstas para o PNE, comprometidas pela aprovação da EC-95.

O neologismo criado pelos que propuseram e apoiaram a medida, denominada por eles de “emenda dos tetos dos gastos”, visa confundir a opinião pública e dá o falso entendimento de que os valores destinados a áreas que são essenciais são desperdiçados e mal gerenciados. O objetivo é confundir as pessoas, quase sempre pouco informadas sobre a importância da aplicação de recursos públicos nesses setores, e manipuladas por uma carga de informações deturpadas pela mídia que se concentra em mostrar os problemas, subestimando os avanços que foram obtidos a partir dos anos 2000 até o golpe. Dessa forma, com essa carga de propaganda e desinformação, passam a reproduzir opiniões de “especialistas” em economia que propagandeiam ser preciso conter “gastos” e permitir que a iniciativa privada possa ter participação nesses segmentos, pois traria uma maior preocupação com a utilização dos recursos.

Envolviam-se assim os mesmos atores que estiveram por trás de toda a preparação e consumação da estratégia que derrubou a presidenta em 2015, e que procuraram rapidamente, por menos de dois anos, aplicar medidas que alterassem radicalmente os rumos que o país tomava. A receita neoliberal, iniciada nos anos do governo Fernando Henrique Cardoso, e que em grande parte foi contida nos governos Lula e Dilma, excluindo-se como dito no início, algumas medidas no plano econômico, foi retomada com força, e tem na EC-95 sua medida mais eficaz. Some-se a isso uma reforma trabalhista feita para atender os interesses empresariais, reduzindo as garantias dos trabalhadores e dificultando suas defesas na justiça do trabalhoDisponível em: https://outraspalavras.net/brasil/por-que-revogar-a-emenda-constitucional-95/. Acesso em: 16 ago. 2018..

Essa eficácia se apresenta em toda sua perversidade nos números impressionantes do desemprego – crescente a cada ano – no aumento da violência, no declínio absurdo dos recursos para a área de saúde, de ciência e tecnologia, educação, enfim, gerando uma situação de absoluto descontrole, levando o país a um caos administrativo e ao total descrédito do governo atual, tanto pela população brasileira quanto pelas autoridades internacionais.

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O que assistimos, então, é exatamente o oposto do que se pretendia quando a presidenta Dilma Rousseff definiu como slogan de seu segundo governo “Pátria Educadora”. A mudança proposta pelo governo Temer, que trouxe como lema de governo a frase positivista da bandeira brasileira “Ordem e Progresso”, significou, com a destruição de políticas públicas absolutamente estratégicas para o desenvolvimento do país, uma situação de descontrole gerando recessão e atraso no caminho do desenvolvimento que o Brasil estava trilhando. E, naturalmente, amplia essa desordem na medida em que sufoca setores estratégicos e, principalmente, retira a proteção às camadas mais pobres, excluindo mecanismos que davam a esses segmentos um alento, em meio a suas dificuldades, mediante a garantia de que poderiam ascender socialmente, o que somente acontece com a possibilidade de acesso ao ensino superior, pois a qualificação é a condição para a melhoria salarial, fato comprovado por diversos indicadores sociais e estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)Disponível em: https://educacao.uol.com.br/noticias/2017/09/12/trabalhador-com-nivel-superior-ganha-140-a-mais-mostra-estudo.htm. Acesso em: 17 ago. 2018..

Considerações finais

Se analisarmos nossa história política e as crises que aconteceram desde que o Brasil se tornou uma República, encontraremos situações bastante críticas e vistas em cada momento como de difícil solução. Mas, seguramente, nenhuma delas pode ser considerada como mais grave do que a situação atual vivida pelo nosso país. O que houve nos últimos três anos foi um vergonhoso ataque ao Estado de Direito e a supressão de conquistas absolutamente importante para o povo brasileiro. Não foi somente a destituição de uma presidenta sem que houvesse crime de responsabilidade, mas uma criminosa sabotagem para impedir que o país pudesse contornar suas dificuldades e, logo a seguir, o ataque a direitos fundamentais ainda minimamente estabelecidos. Quaisquer indicadores sobre as mudanças ocorridas no Brasil podem atestar isso, não é necessário sequer nos prendermos aqui em buscar esses dados para citá-los. São situações que estavam bem presentes e não podem ser refutadas, a não ser mediante um processo destrutivo de credibilidades e de desconstrução de uma realidade mediante a massificação de notícias manipuladas e de fake news que visavam abalar reputações, criar desconfiança na população, até o ponto de levar as camadas mais beneficiadas por medidas progressistas a procurarem alternativas ultrarreacionárias para solução de seus problemas e aflições, a ponto de apegarem-se a quem destruiu os mecanismos que lhes garantiam melhorias, por absoluta fuga da realidade, por meio de uma alienação construída por discursos políticos conservadores e uma terrível campanha nas mídias.

Um dos exemplos mais visíveis dessas armas utilizadas para gerar essa alienação tem sido a perseguição e intimidação sobre as escolas e universidades, visando impedir a liberdade de conhecimento e procurando impor uma mordaça a seus professores, de modo a silenciar a crítica e evitar que toda a farsa montada na destituição da presidenta Dilma seja denunciada. O nefasto projeto “Escola sem Partido” se tornou objeto de uma vergonhosa audiência, concedida pelo então empossado ministro da Educação, Mendonça Filho, a indivíduos sem nenhuma credibilidade e representatividade. E isso acabou por se constituir numa senha para que houvesse perseguições a professores que ousassem debater a crise brasileira gerada pelo golpe, nas escolas e universidades.

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Ao mesmo tempo intensificou-se a ação do Ministério Público por meio de decisões também tomadas pelo judiciário e executadas pela Polícia Federal, pressões e ameaças, e até mesmo com prisões, ações que pouco se diferenciavam da forma como os profissionais da educação foram tratados durante a ditadura militar. O intuito é claro, evitar que a população tenha a percepção de que foi orquestrado um movimento pós-eleição de 2014 de não aceitação do resultado eleitoral e de tomada do poder por meios fraudulentos, golpeando a Constituição Brasileira sob o beneplácito de um judiciário que carregava rancor contra um governo que lhe negara absurdos aumentos em um momento de anunciada crise fiscal.Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-jul-22/dilma-veta-reajuste-judiciario-federal-violar-interesse-publico. Vergonhosamente nos deparamos com uma realidade em que, além de um golpe institucional, passávamos a conviver com uma ditadura de toga, e com atitudes de setores do Ministério Público que definiam suas ações mediante visões ideológicas sustentadas por um fundamentalismo religioso e escoradas em convicções moralistas hipócritas, à revelia do destino que teria o país e as condições sociais que poderiam empurrar a sociedade para um abismo.

No que se transformou o país ao longo desses três últimos anos? É impossível desconhecer o estrago feito por esse assalto ao Poder e as condições econômicas e sociais a que ele levou. Mais difícil ainda negar que a Emenda Constitucional 95 representa uma dose mortífera de quimioterapia aplicada a um paciente em câncer terminal. Não houve em nenhum momento, apesar do discurso destoado da realidade, um mínimo de sensibilidade com as consequências que tais medidas gerariam para a população, o aumento de desemprego que isso causaria e o abandono a que ficariam expostos setores fundamentais do Estado brasileiro.

Mas restava ainda impedir que as próximas gerações pudessem adquirir capacidades críticas e recebessem ensinamentos humanísticos que lhes garantissem um mínimo de sensibilidade social. Por isso duas outras medidas adotadas no âmbito de uma reforma educacional conservadora, retirava do currículo a obrigatoriedade de o jovem ter acesso a disciplinas que carregam esses elementos básicos para a sociabilidade. Essas medidas são a reforma do ensino médio e a elaboração de uma nova Base Nacional Comum Curricular. Nitidamente, o pretendido é reduzir a importância de determinadas disciplinas que, além de favorecer uma visão crítica aos alunos, são formadoras de valores republicanos e de valorização da cidadania com aceitação das diferenças e preocupações sociais. Trata-se, para além disso, de beneficiar as corporações que atuam no ensino privado e concentradas em poucos investidores num crescente monopólio, na consolidação de uma educação cada vez mais mercantilizada e, consequentemente, excludente, e de privilegiar cada vez mais as classes sociais mais abastadas financeiramente.

A reforma do ensino médio já foi aprovada e segue no curso das ações para ser gradualmente implantada. Já a nova base curricular se encontra em processo de finalização e será acelerada, mais ainda agora com o trágico caminho que o país tomou após o processo eleitoral. Tudo isso, a despeito das denúncias que apontam uma inevitável queda na educação com as mudanças propostas incluindo a ampliação da desvalorização dos professores, a retirada do protagonismo dos jovens, além de forçá-los a fazer escolhas precoces pelo fato de terem que decidir muito cedo a área de concentração que deverão seguir.

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Não restam dúvidas de que a reorientação política do governo Temer para o Ministério da Educação teve o intuito de consolidar os objetivos que se pretendiam com o movimento que levou ao golpe institucional de 2015, ou seja, ver na Educação um setor estratégico para desconstruir todas as ações que estavam transformando o país. Para garantir que nos próximos governos essas medidas estejam consolidadas, a Emenda Constitucional 95 foi aprovada para cumprir esse desígnio, mantendo praticamente congelados os investimentos em educação para os próximos 20 anos, num retrocesso terrível e absolutamente danoso para o desenvolvimento brasileiro.

Caberá à sociedade brasileira despertar da letargia e reagir de forma organizada, por meio das entidades que representam os diversos segmentos da educação, para desfazer todas essas medidas danosas. A realidade trazida pelo resultado eleitoral imporá essa necessidade porque as consequências perversas não tardarão a aparecer e não restará outro caminho a não ser pressionar o Congresso Nacional para que seja revogada essa emenda constitucional e sejam dadas as garantias de investimentos necessários para fortalecimento da educação em todos os níveis. Isso, por si só, já será uma árdua tarefa, tendo em conta o perfil do novo parlamento brasileiro, profundamente conservador, escorado em valores reacionários e eivados de preconceitos.

Retomar os rumos do país, de forma a afastá-lo do precipício não será fácil, mas é condição necessária para garantir a correção do curso do desenvolvimento com inclusão social. Não podemos perder as esperanças.

Sobre o autor

ROMUALDO PESSOA CAMPOS FILHO • Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Goiás – UFG (2013). Mestre em História pela Universidade Federal de Goiás (1997). Licenciado em História pela Universidade Federal de Goiás (1988). Professor de Geopolítica no Instituto de Estudos Socioambientais da UFG. Coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas das Dinâmicas Territoriais (LABOTER-IESA). Link do Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5071361971210106

Referência

RIBEIRO, D. O Povo Brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.